isto e aquilo
um olhar poético
Com os fios das entranhas
I por Viviane Lucas
Me lembro de quando a poesia entrou na minha vida. Eu tinha uns nove anos talvez. Cecília Meireles me pegou pelas mãos e me levou para uma outra dimensão até então nunca experimentada.
Ela me disse, poeticamente, quase cantando, que não se pode ter tudo.
”Ou guardo o dinheiro e não compro o doce, ou compro o doce e gasto o dinheiro.” Essa era a lição que dava nome ao livro e ao poema Ou isto ou Aquilo.
Não sei para as outras crianças da minha turma, mas para mim, esse livro foi um divisor de águas. Eu lia e relia incontáveis vezes seus poemas e dentro da minha cabeça de nove anos pensava: como ela faz isso?
Me fazia tão bem! Aquelas rimas, a verdade da vida escrita de uma forma tão divertida e adocicada. Guardo o livro até hoje. Amarelado pelo tempo.
Tempo esse que me encaminhou para outras mulheres escritoras: Lygia Bojunga e sua Bolsa Amarela, Ruth Rocha, Ana Maria Machado, Sylvia Orthof, Roseana Murray, Sônia Rosa. Todas frequentaram as salas de aula em que lecionei e li suas histórias e poemas dezenas de vezes para aqueles olhinhos brilhantes.
Mais tarde, quando me dei conta que a poesia também fazia parte da minha existência, fui atravessada pela intensidade de Clarice Lispector, Hilda Hilst, Ana Cristina Cesar, Conceição Evaristo e outras escritoras contemporâneas que se destacam brilhantemente no que fazem.
Gosto de pensar que estão todas dentro de mim. Minhas leituras me compõem e me permito passear entre elas, costurando isto com aquilo. Tecendo meu próprio sentir.
A qualquer momento, a menina que busca encantamentos resgata lá dentro a pureza de Cecília. Por outro lado, a mulher que me tornei é livre para viver todos os desejos e assumir seus “medos bobos e suas coragens absurdas”, como ensinou Clarice.
Ler essas mulheres me ensinou a alinhavar a vida com os fios das entranhas.
A proclamar a escrita como bravura, mas também como ternura.
Nesse caso, não há de ser ou isto ou aquilo, mas isto e aquilo também.
Sou psicóloga, professora e escritora. Em 2022 publiquei o livro de poemas "Andarilha" (Ed. Lura). Um sonho, um respiro. Uma forma de dança. Acabei de lançar meu segundo livro. “Um lugar pra guardar imensidões é uma coletânea de poemas que falam das miudezas e grandezas da vida. Já participei também das antologias "Crônicas da Manhã" e "Onde canta o Sabiá" e sopro minhas palavras no Instagram @contosdaluanova.