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cata vento

diários e imensidões

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Depois dos 40 é ladeira acima 

I   por Raquel Cesário

Do alto dos meus 160 centímetros e 42 anos eu vejo a vida da ladeira. Mas não é ladeira abaixo. É mais como uma ladeira que segue subindo.

 

Eu poderia falar que aos 40 anos lancei meu primeiro livro infantil. Aos 41, participei de uma coletânea feminina. Aos 42, publiquei meu segundo livro infantil e iniciei outra graduação. Sim! Voltei aos bancos escolares, rodeada de jovens com idades para serem meus filhos. Mas não são. São meus colegas, calouros como eu. A diferença? Eu tenho o dobro (ou mais) de tempo de vida.    

 

No contexto de voltar a estudar, me sinto como qualquer um dos meus colegas de classe. Até me sentar naquelas (malditas) cadeiras e minha coluna me alertar que os 17 estão no passado. Tenho 42 e carrego essa idade nas costas com a mesma alegria de 17. Mas já não danço nas baladas. Danço na sala, acompanhada da minha filha.  

 

Já não pinto o cabelo de várias cores, mas, aos poucos, os grisalhos abrem caminho.  

 

Já não durmo até meio dia.  Acordo com as galinhas. Na verdade, com minha pequena fazendo festa por mais um dia.  

Não viro as noites em barzinhos. Farra para mim é estar com poucos amigos até a hora que o corpo aguentar, o que costuma ser, no máximo, meia-noite.  

 

Já não passo o dia inteiro na universidade porque a casa, a vida adulta e os boletos seguem me esperando.

 

Hoje, o melasma dos “enta” contrasta com as sardas da juventude, para balancear sabedoria e rebeldia no mesmo corpo. E como é bom aprender a amar o próprio corpo e o caminho que percorri.

 

Depois dos 40 é ladeira abaixo? Não mesmo! Ainda que eu lembre que, quando era adolescente, estar nos “enta” era sinal de “velhice”. Sabia de nada, inocente! Hoje, estar nos “enta” é perceber cada marca do rosto, cada dobra do corpo, e saber que é privilégio estar viva.

 

O sorriso é acompanhado pelas rugas, mas que bom ter motivos para sorrir. Os exercícios são sentidos em partes do corpo que nem sabia que existiam, mas que alegria estar em movimento. A leitura já pede óculos, mas que aventura poder ler.

 

As noites já não são viradas em boates (ainda chama assim?), mas que especial é poder vivê-las com minha pequena família.

 

O metabolismo já não é o mesmo, mas que libertação é saber que posso diversificar o paladar. Com 15, os “enta” pareciam distantes. Mas já estão aqui.

 

Os 40 mudam rosto e corpo, mas não mudam a essência. E que benção é aprender a amar nosso corpo como ele sempre mereceu.

 

A idade não deve assustar. Deve dar orgulho. De tudo que vivemos. Que trilhamos. Dos amigos que fizemos. Das decisões que tomamos. Dos lugares que visitamos. Dos abraços que demos e daqueles que recebemos. A vida, minhas caras, não deve parar. Deve ser reinventada. Regada. Celebrada.

 

A meia idade é mais um capítulo das nossas vidas, mas não o último. Definitivamente, não é o último...

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Sou pedagoga, acadêmica de Fonoaudiologia e mãe de uma criança que gagueja.  Por ela, me tornei autora de livros infantis. Sou também admiradora confessa do céu e das baleias. O que não sou é mulher de raízes, e, sim, de asas. Asas próprias.

Escrevo no Instagram @raquel_cesarioo. Vai ser muito legal te receber por lá.

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