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Foto do escritorFernanda Baroni

Roda a saia, gira a vida

Atualizado: 19 de nov.

14ª edição da Festa Literária das Periferias homenageia Beatriz Nascimento

A Flup – Festa Literária das Periferias encerrou a sua 14ª edição com uma programação composta por 90% de mulheres negras, sob o tema “Roda a saia, gira a vida”. Entre 11 e 17 de novembro o Circo Voador recebeu debates, mesas literárias, performances e shows numa jornada que abriu caminhos para que livros, ideias e experiências literárias chegassem mais longe. Além das atrações no Circo, a Flup promoveu atividades como slams, lançamentos de livros, saraus e exibições de filmes na Casa de Luzia, na Lapa, a Casa dos Processos Formativos da Flup + Malê. 


Conceição Evaristo, Esmeralda Ribeiro e Andrea Bak no sarau Beatriz Nascimento, na Flup 2024


Entre uma diversidade incrível de propostas, a programação contou com um sarau para reverenciar o legado ancestral de Beatriz Nascimento, quilombola, historiadora, professora, poeta e ativista, que fez da palavra sua maior ferramenta de revolução. Na mesa de lançamento, o sarau reuniu Conceição Evaristo, Esmeralda Ribeiro e a MC Andrea Bak alternando poesias autorais com textos da homenageada.




Conceição Evaristo compartilhou com o público lembranças vividas com Beatriz Nascimento, entre as quais o poema A NOITE NÃO ADORMECE NOS OLHOS DAS MULHERES, escrito em memória à amiga homenageada e publicado no volume 19 da antologia Cadernos Negros.


Conceição Evaristo lendo poema A noite não adormece nos olhos das mulheres


A noite não adormece

nos olhos das mulheres

a lua fêmea, semelhante nossa,

em vigília atenta vigia

a nossa memória.


A noite não adormece

nos olhos das mulheres

há mais olhos que sono

onde lágrimas suspensas

virgulam o lapso

de nossas molhadas lembranças.


A noite não adormecenos

olhos das mulheres

vaginas abertas

retêm e expulsam a vida

donde Ainás, Nzingas, Ngambeles

e outras meninas luas

afastam delas e de nós

os nossos cálices de lágrimas.


A noite não adormecerá

jamais nos olhos das fêmeas

pois do nosso sangue-mulher

de nosso líquido lembradiço

em cada gota que jorra

um fio invisível e tônico

pacientemente cose a rede.





A jornalista, escritora e ativista Esmeralda Ribeiro também emocionou com leituras de textos de Beatriz Nascimento, entre eles, QUERO ESCREVER UM CONTO, de 1984.


Esmeralda Ribeiro recitou o texto Quero escrever um conto, de Beatriz Nascimento, no sarau da Flup 2024

Quero escrever um conto. Pode ser um conto-de-fadas, um conto-do-vigário, um conto erótico.

Quero escrever um conto, um conto de amor e de vida.

Quero dizer de felicidades. Alguma coisa que seja ela mesma.

Assim como um sentido em atuação: ouvidos, olhos e bocas.

Quero escrever um conto de amor.

Um conto verdadeiro, com eletricidade de ser.

Quero um conto, um canto, um ponto na trajetória do devenir.

Para um futuro mais belo.

Futuro que vislumbro na cor dourada do sol da janela dos Arquivos

Arquivo casa onde eu morei e que em mim mora.

Quero escrever um conto ao silêncio dos documentos.



A Flup foi declarada patrimônio cultural imaterial pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, em 2023. Nesta edição, apresentada pelo Ministério da Cultura e Shell, o espaço do Circo Voador se transformou no quilombo urbano da Lapa recebendo vozes nacionais e internacionais, representantes de periferias regionais, climáticas, raciais, étnicas e de gênero, além da exposição fotográfica “João Cândido, um Herói Nacional”, uma livraria com catálogo variado a preços acessíveis e atrações musicais no palco Ori Música.  


Ano que vem tem mais e Conceição Evaristo já aceitou o convite para ser a homenageada da Flup 2025, feito durante a entrega do prêmio Ecio Salles  




Fernanda Baroni e Bárbara Anaissi são editoras da revista literária Letra Miúda





Fernanda Baroni e Bárbara Anaissi são jornalistas e editoras da Revista Letra Miúda e acompanharam as atrações de lançamento, no primeiro dia da Flup.

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